As sextas-feiras tendem a ser boas:
- Alô!
- Oi, sou eu. Saí agora. Você está onde?
- No meu apê, esperando você.
- Já estou indo bonitão. Desculpe a demora, você sabe...
- .. reunião! Sei sim.
- Bom, chego em quinze.
- Estarei aqui... vou deixar a porta destrancada. Já avisei ao porteiro.
- Tá bom. Mas por...? Ah... entendi. Até já.
- Beijo.
- Outro.
Ela desligou o celular e aumentou o som do rádio. Tocava uma música antiga do Eric Clapton - daquelas nostálgicas - que embalava o carro pelas ruas congestionadas do pior horário do dia. Mesmo assim, ela sorria; e sentia-se protagonista de um filme romântico: seu emprego era ótimo, tinha vários amigos (fiéis, o que era raro nesses dias), e seu namorado era divertido, carinhoso e extremamente atencioso – não era daqueles bonitões do estilo Brad Pitt (até aí, ela também se assemelhava em nada a uma Cláudia Schiffer), mas eles se completavam e tudo estava ótimo: teria um final feliz, o filme!
Destrancada, como ele havia prometido. As luzes estavam apagadas, mas entrava claridade suficiente pela janela da sala e ela podia se guiar até o quarto. No fundo, não gostava muito de surpresas, mas tentava se convencer de que se preocupava demais. Passava pela sala e, a meio caminho do quarto, tropeçou em um sapato. Apertou um pouco os olhos para se concentrar nas formas pouco iluminadas no chão e conseguiu identificar, ao lado do sapato, uma meia e uma calça jeans. Logo a frente, outra peça de roupa. E outra. E mais uma - todas jogadas no chão, em cadeia até o quarto. Ela sorriu de sua própria ingenuidade, e foi seguindo a trilha deixada pelo namorado. Passou pela camiseta, uma jaqueta, outra meia, cueca... sutien!?
Nesse momento, chegava à porta – entreaberta – e, um pouco confusa, escondeu de volta o sorriso enquanto entrava.
Assustou-se com o que viu! Outra mulher, deitada na cama, saltou assustada e cobriu, com o lençol, seu corpo nu.
- Que diabos é isso?
- Que diabos digo eu. Como entrou aqui?
- Eu que pergunto isso! Que droga você faz aqui?
- Eu moro aqui.
- Como é? Mas você é muito abusada.
- Abusada é você, que entra assim na casa dos outros. Posso saber quem é você?
- Eu sou a namorada do Heitor, queridinha.
- Namorada. Que papo é esse? Heitor, venha já aqui! (ela grita). Pois eu sou a esposa do Heitor, “queridinha”.
- Você só pode estar de sacanagem. Se essa era a surpresa que ele tinha pra mim, já vou avisando que não estou gostando nada. “Vou deixar a porta destrancada”. Eu namoro o Heitor há dois anos, fofa, e saberia se ele fosse casado.
- Dois anos? Heitor!!! (grita mais alto) Saia já dessa porra de banho e venha aqui! E depois eu quem sou a abusada? Você anda saindo com o meu marido há dois anos, tem a cara de pau de vir encontrar com ele na nossa casa, e ainda eu quem sou a abusada? Eu quem sou a abusada?
- Casa de vocês?? Heitor!! (grita dessa vez) Eu costumo vir dormir aqui, com o “meu” namorado Heitor, pelo menos, umas três vezes por semana. Ele mora sozinho; e sempre morou. Então, não tente me enrolar.
- Três vezes por semana? Sua putinha...
- Olhe aqui, queridinha, melhor você controlar o nível. Se existe alguma putinha aqui, ela está deitada na cama do meu namorado.
A porta do banheiro da suíte se abre, e Heitor entra no quarto, molhado, e sem toalha alguma enrolada.
- Espero que você tenha visto um rato. Posso saber o motivo da urgên... caraca! Que merda?
- Quem é você?
- Heitor. Quem é “você”?
- Você não é o Heitor. E eu não estou gostando dessa brincadeira. Na verdade, desde o começo. Heitor!! (grita) Não tem graça! (grita mais).
- Moça, não sei qual é o seu problema. Meu nome é Heitor e eu moro aqui.
- Nós moramos aqui! Essa sirigaita disse que namora você há um tempão. E que você come ela, pelo menos, umas três vezes por semana! Safado dos infernos.
- Sirigaita. Olhe aqui...
- Como é? Eu nem conheço essa moça. Nunca a vi na minha... quer dizer, já vi sim!
- Ah há! Então ela tinha razão. Filho da puta. Eu vou me trocar e vou ficar na minha mãe. Depois volto aqui e pego as minhas coisas.
- Deixa disso, mulher! Eu quis dizer que já a vi por aqui, no prédio! Você não namora o rapaz do 84?
- Sim, o Heitor. Que mora nesse apartamento, o 84. Exatamente.
- Heitor também? Bom, eu não o conheço o seu namorado pessoalmente, mas meu nome é Heitor - disso eu não tenho dúvidas. Só que esse é o 64. Não o 84.
- ...
Oito minutos depois.
- Alô!
- Oi, sou eu.
- Gatinha, eu já estou quase dormindo.
- Já estou subindo. Estou aqui no seu vizinho, no 64. Vou tomar um cafezinho e já subo.
- Como é? Que porra você está fazendo no apartamento do meu vizinho? E tomando cafezinho... você só pode estar tirando uma com a minha cara. Eu cheguei aqui já faz 2 horas e estou te esperando desde...
- Já subo. Conversamos depois. Acredite, é complicado...
- Vou dormir. Até. Saudações ao vizinho do 64...
- .. Heitor.
- Que é?
- O nome dele também é Heitor.
- Como? E eu com isso?
- Haha.. já subo. Beijo.
- ...
- Alô!
- Oi, sou eu. Saí agora. Você está onde?
- No meu apê, esperando você.
- Já estou indo bonitão. Desculpe a demora, você sabe...
- .. reunião! Sei sim.
- Bom, chego em quinze.
- Estarei aqui... vou deixar a porta destrancada. Já avisei ao porteiro.
- Tá bom. Mas por...? Ah... entendi. Até já.
- Beijo.
- Outro.
Ela desligou o celular e aumentou o som do rádio. Tocava uma música antiga do Eric Clapton - daquelas nostálgicas - que embalava o carro pelas ruas congestionadas do pior horário do dia. Mesmo assim, ela sorria; e sentia-se protagonista de um filme romântico: seu emprego era ótimo, tinha vários amigos (fiéis, o que era raro nesses dias), e seu namorado era divertido, carinhoso e extremamente atencioso – não era daqueles bonitões do estilo Brad Pitt (até aí, ela também se assemelhava em nada a uma Cláudia Schiffer), mas eles se completavam e tudo estava ótimo: teria um final feliz, o filme!
Destrancada, como ele havia prometido. As luzes estavam apagadas, mas entrava claridade suficiente pela janela da sala e ela podia se guiar até o quarto. No fundo, não gostava muito de surpresas, mas tentava se convencer de que se preocupava demais. Passava pela sala e, a meio caminho do quarto, tropeçou em um sapato. Apertou um pouco os olhos para se concentrar nas formas pouco iluminadas no chão e conseguiu identificar, ao lado do sapato, uma meia e uma calça jeans. Logo a frente, outra peça de roupa. E outra. E mais uma - todas jogadas no chão, em cadeia até o quarto. Ela sorriu de sua própria ingenuidade, e foi seguindo a trilha deixada pelo namorado. Passou pela camiseta, uma jaqueta, outra meia, cueca... sutien!?
Nesse momento, chegava à porta – entreaberta – e, um pouco confusa, escondeu de volta o sorriso enquanto entrava.
Assustou-se com o que viu! Outra mulher, deitada na cama, saltou assustada e cobriu, com o lençol, seu corpo nu.
- Que diabos é isso?
- Que diabos digo eu. Como entrou aqui?
- Eu que pergunto isso! Que droga você faz aqui?
- Eu moro aqui.
- Como é? Mas você é muito abusada.
- Abusada é você, que entra assim na casa dos outros. Posso saber quem é você?
- Eu sou a namorada do Heitor, queridinha.
- Namorada. Que papo é esse? Heitor, venha já aqui! (ela grita). Pois eu sou a esposa do Heitor, “queridinha”.
- Você só pode estar de sacanagem. Se essa era a surpresa que ele tinha pra mim, já vou avisando que não estou gostando nada. “Vou deixar a porta destrancada”. Eu namoro o Heitor há dois anos, fofa, e saberia se ele fosse casado.
- Dois anos? Heitor!!! (grita mais alto) Saia já dessa porra de banho e venha aqui! E depois eu quem sou a abusada? Você anda saindo com o meu marido há dois anos, tem a cara de pau de vir encontrar com ele na nossa casa, e ainda eu quem sou a abusada? Eu quem sou a abusada?
- Casa de vocês?? Heitor!! (grita dessa vez) Eu costumo vir dormir aqui, com o “meu” namorado Heitor, pelo menos, umas três vezes por semana. Ele mora sozinho; e sempre morou. Então, não tente me enrolar.
- Três vezes por semana? Sua putinha...
- Olhe aqui, queridinha, melhor você controlar o nível. Se existe alguma putinha aqui, ela está deitada na cama do meu namorado.
A porta do banheiro da suíte se abre, e Heitor entra no quarto, molhado, e sem toalha alguma enrolada.
- Espero que você tenha visto um rato. Posso saber o motivo da urgên... caraca! Que merda?
- Quem é você?
- Heitor. Quem é “você”?
- Você não é o Heitor. E eu não estou gostando dessa brincadeira. Na verdade, desde o começo. Heitor!! (grita) Não tem graça! (grita mais).
- Moça, não sei qual é o seu problema. Meu nome é Heitor e eu moro aqui.
- Nós moramos aqui! Essa sirigaita disse que namora você há um tempão. E que você come ela, pelo menos, umas três vezes por semana! Safado dos infernos.
- Sirigaita. Olhe aqui...
- Como é? Eu nem conheço essa moça. Nunca a vi na minha... quer dizer, já vi sim!
- Ah há! Então ela tinha razão. Filho da puta. Eu vou me trocar e vou ficar na minha mãe. Depois volto aqui e pego as minhas coisas.
- Deixa disso, mulher! Eu quis dizer que já a vi por aqui, no prédio! Você não namora o rapaz do 84?
- Sim, o Heitor. Que mora nesse apartamento, o 84. Exatamente.
- Heitor também? Bom, eu não o conheço o seu namorado pessoalmente, mas meu nome é Heitor - disso eu não tenho dúvidas. Só que esse é o 64. Não o 84.
- ...
Oito minutos depois.
- Alô!
- Oi, sou eu.
- Gatinha, eu já estou quase dormindo.
- Já estou subindo. Estou aqui no seu vizinho, no 64. Vou tomar um cafezinho e já subo.
- Como é? Que porra você está fazendo no apartamento do meu vizinho? E tomando cafezinho... você só pode estar tirando uma com a minha cara. Eu cheguei aqui já faz 2 horas e estou te esperando desde...
- Já subo. Conversamos depois. Acredite, é complicado...
- Vou dormir. Até. Saudações ao vizinho do 64...
- .. Heitor.
- Que é?
- O nome dele também é Heitor.
- Como? E eu com isso?
- Haha.. já subo. Beijo.
- ...
15/junho/2007
<< Home