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Jonas sempre foi um rapaz batalhador. Pele ressecada pela exposição constante ao sol e detentor de um generoso penteado afro, tinha em seu olhar uma seriedade ancestral incrustada em uma feição melancólica que, erroneamente, despertava na maioria das pessoas uma sensação inexplicável de insegurança e, até mesmo, medo.

Era o mais velho dentre os sete filhos de Dna. Nenê – Negrinha para os íntimos da vizinhança – e se sentia responsável em ajudar no sustento da pequena casa – de um estilo nada colonial, com dois pequenos cômodos – no lado oeste do morro. Lado nobre.

‘Touro’ – como era conhecido – nutria de grande dificuldade em permanecer em emprego algum por um período superior a dois meses. Chegava no horário, trabalhava direito e, acima de tudo, reclamava de nada. Não podia pensar em si próprio; os irmãos e a mãe dependiam dele também. Mas por algum motivo, não durava... não se passavam oito semanas e lá ia Jonas procurar outro emprego... e depois mais um... pior que isso, era a longa espera desempregado. Correndo de um lado pra outro atrás de uma oportunidade.

Em uma entressafra sem trabalho no final de 95 perdeu a razão; esqueceu dos sentimentos e, com a barriga roncando, cometeu seu primeiro e único equívoco. Foi julgado por uma tentativa frustrada de furto de melancia, e levado preso. Equívoco maior ainda. Jamais se esquecera do que lhe disse o juiz, ao pé do ouvido, enquanto era conduzido ao cárcere: - Crioulo filho da puta! Tu merecia coisa pior.

Cumpriu apenas metade dos seis anos a que fora condenado; e isso não alivia em nada.

Passava o tempo na cadeia lendo; hábito que nunca teve por falta de tempo e, de certa forma, por ter sido sempre bastante ignorante mesmo. Manteve amizade com a maioria dos detentos e dividia com eles o prazer da imaginação que lhes trazia os livros. Machado de Assis, Jorge Amado, e até mesmo Camões e Gil Vicente ele lia, em voz alta, para os colegas. Nada daquelas frescuras de Paulo Coelho e livros de auto-ajuda. Nada podia ajudá-los. Recentemente, se entretiam com contos da mitologia grega, repleta de minotauros, ciclopes, sereias, deuses e semideuses; e um personagem em especial chamou a atenção de todos: Ícaro, o rebelde voador. Que encarou a morte em uma tentativa desesperada, porém ousada, de fugir de sua própria confinação.

Negrinha o visitava quando podia e lhe trazia biscoitos de sequilho. O filho falava pouco, e evitava comentar sobre seu recente plano de fuga. Tentaria fugir dali, voando, assim como Ícaro.

Com a ajuda dos demais prisioneiros, e no mais absoluto segredo – obviamente – construiu durante meses as asas que lhe trariam a liberdade. Usou uma boa quantidade de penas retiradas dos travesseiros dos detentos e envolveu uma armação construída com madeira leve, furtada da marcenaria. Afixou tudo com cola de sapateiro e, claro, muita cera. As escondia dentro do colchão para não chamar a atenção e, deitado sobre elas a noite, sonhava em cores.

Jonas era esperto e, diferentemente de Ícaro, planejou fugir à noite; não queria que suas asas derretessem. Aproveitou o horário em que era escalado para limpar a cozinha após a janta; quando os guardas estavam desatentos sob o efeito digestivo. Roubou dois grandes pedaços de pão – simplesmente por ódio e pirraça – e partiu para o pátio externo à ala amarela, onde seu colega de cela o aguardava com as asas, que haviam ficado prontas na noite passada. Jonas não perdeu tempo e em questão de minutos estava unido à engenhoca de penas, e em um piscar de olhos, voando alto sobre o muro do presídio; livre da ação predatória do sol, e do julgamento preconceituoso do Estado. Ganhava altitude e imaginava a cara dos colegas ao verem a concretização de um fantasioso mito grego. Ele voava livre em direção ao horizonte escuro. Sol algum poderia lhe deter. Seria melhor que Ícaro, seria...

...abatido.

O ‘Touro’ foi derrubado por dois tiros certeiros de uma espingarda enferrujada, empunhada por um guarda descontente com a vida e normalmente distraído – que, ao invés de prestar atenção no interior do presídio, ficava sentado, absorto, encarando as estrelas acima e sonhando com os beijos da mulher amada – e que havia avistado a silhueta de um enorme pássaro negro sob a luz da lua. Achou até romântico, por alguns segundos, até perceber que o pássaro ornava um inusitado penteado afro.

Foi encontrado morto, oito minutos depois pelos cães farejadores, e abandonado ali mesmo nas redondezas desérticas que rodeavam aos muros da prisão. Os pedaços de pão, ignorados pelos guardas – e até mesmo pelos cachorros – permaneceram esparramados ao lado do corpo, e não demoraram a juntar formigas.


05/outubro/2005